Guerra é Paz
Liberdade é Escravidão
Ignorância é Força
Eu olhava para os lados, olhava para os outros alunos, não conseguia pensar em nada que não fosse desespero, insanidade e desesperança. Eu fui arrebatado de uma realidade pútrida, fétida, que era essa dimensão paralela do livro, mas ao retornar daquele mundo, eu passei a enxergar a face do Grande Irmão por toda parte.
Eu consigo citar 3 grandes distopias do último século:
Laranja Mecânica - Anthony Burgess
1984 - George Orwell
Admirável Mundo Novo - Aldous Huxley
Dos três, em termos de qualidade literária, eu classifico do melhor ao pior, exatamente na ordem do primeiro ao terceiro. Contudo, em termos de relevância, considero os dois últimos os mais significativos. Justamente por eles representarem realidades aparentemente opostas. (ainda farei uma resenha de Laranja Mecânica, tanto livro quanto filme)
O universo de Admirável Mundo Novo, representa um futuro onde as pessoas são programadas desde a sua fase de feto, e recebem constante condicionamento social desde o nascimento até a morte. Literalmente uma constante lavagem cerebral. Uma sociedade dividida em castas (Alfa, Beta, Gama, Omega...), onde cada casta atende a uma camada específica da divisão do trabalho. São condicionados desde o berço a aceitarem e apreciarem sua condição social como a mais cabível. Os Betas, gostam de serem Betas, por não serem tão estúpidos como os Gamas, mas também não serem tão cobrados quanto os Alfas. E com essa lógica, todos são impelidos a adorarem e cultuarem a própria posição ante a sociedade.
A fecundidade é totalmente controlada pelo Estado, já que todos os indivíduos nascem de dentro de encubadoras. Os ovários e espermas são doados ao estado, que direciona o fluxo e designa a função para cada indivíduo desde o berço. A sociedade inteira funciona como uma enorme linha de montagem, auto-suficiente, e aonde tudo atende a um propósito específico. Como o nascimento é propriedade do Estado, não se pode constituir família. É dado tal que as pessoas são incentivadas a serem sexualmente promíscuas.
Altamente tecnológica, a sociedade do Mundo Novo dota de uma exacerbada industria do lazer. Sem contar com a droga chamada SOMA - do inglês, PLUS - que as pessoas tomam como forma de extraviar os efeitos do estresse cotidiano. Seria uma espécie de SUPER CAPITALISMO, operando em perfeita harmonia e sincronia. As pessoas trabalham para conseguir renda, e sem questionar, gastam todo o dinheiro com lazeres caros e fúteis. Não se permite desfrutar uma tarde ensolarada deitado no topo de um prédio sem gastar dinheiro, nem mesmo na companhia de um bom amigo, conversando descompromissadamente. Afinal, tempo livre, é para ser gasto por meio do dinheiro.
Por outro lado, 1984 nos transporta para uma realidade de um Estado totalitário, controlador, com poderes praticamente absolutistas. A sociedade é dividida entre os que fazem parte da maquina do Governo (Partido) e os civis comuns, a Prole (ou proletariado).
Em relação ao Partido, é ainda dividido em dois seguimentos, o Partido Externo e o Partido Interno. O Partido Externo diz respeito aos trabalhadores de baixa patente, que pegam no trabalho mais pesado dentro do corpo administrativo. Os integrantes do Partido Interno, além de várias vantagens e benefícios, pertencem à alta patente e participam das decisões mais internas e secretas.
O Governo é dividido em quatro ministérios. Todos, cujos denominações descrevem exatamente o oposto de suas funções:
Ministério da Paz (promove a Guerra)
Ministério da Verdade (manipula as informações)
Ministério da Fatura (responsável pelo racionamento dos recursos)
Ministério do Amor (responsável por fazer carinho com ferro e eletrochoque nos civis indisciplinados)
A constante antítese resume a filosofia dessa sociedade. É o dito duplipensar (nos termos na novilingua). Duplipensar significa aceitar duas ideias contrárias, simultaneamente, e alternar entre uma e outra à medida do necessário. Portanto, se em um momento é necessário aceitar que a morte é um prejuízo inestimável, se for para atender à vontades do Grande Irmão (líder onipresente/onisciente), tolera-se a morte como um mal não apenas necessário, mas desejável.
Monitorados constantemente pelas teletelas (televisões que emitem imagens ao mesmo tempo que captam imagens - hello, X BOX ONE!), os cidadãos devem mostrar constantemente seu ânimo e dedicação ao Grande Irmão, seu líder supremo, e se mostrarem convictamente alinhados com a ideologia do Partido. Qualquer desvio é intolerável, e até mesmo seus pensamentos são monitorados. Não por meio de eletrodos na cabeça das pessoas, mas por meio de polícias especializadas em identificar ideocriminosos. Homens capazes de observar as mínimas reações ou indícios de desvio moral, mesmo que esses desvios só ocorram no íntimo de cada indivíduo. As próprias crianças são treinadas para atuarem como mega espiãs, incentivadas a denunciarem até mesmo os próprios pais, caso identifiquem nesses traços de traição contra o GI.
Eu poderia passar horas escrevendo e descrevendo minuciosamente o ambiente de cada um desses livros, mas nada supera a leitura em si. O meu objetivo aqui não é esse. Mas formar um paralelo entre as realidades dos livros e o mundo que vivemos hoje. Afinal, quem estava "certo" sobre o futuro? Orwell ou Huxley?
Eu diria que os dois, e ao mesmo tempo nenhum. Enxergo traços das duas distopias na nossa realidade. Huxley acreditava que nossos prazeres iriam nos aprisionar, enquanto Orwell pensou que tudo o que odiamos iria nos submeter. Hoje, vivemos as duas realidades em uma só.
Televisão, facebook, twitter, vídeos de gatinhos, sites de humor barato, 9GAG, seriados de televisão, livros best-sellers, toda essa parafernália nos condiciona e nos diverge a atenção que poderia ser coordenada para diversas outras atividades. Conheço pessoas que não têm outra definição de lazer que não seja assistir filmes ou baixar um novo seriado. Assistem temporadas inteiras em questão de dois ou três dias. E quando acabam, não tem outra opção senão continuar buscando e procurando um outro anime, ou outro mangá, ou outro filme ou outro, outro, outro meio de preencher o tempo que elas não suportam passar consigo mesmas. Algo que lhes sufoque os pensamentos, pois, se a televisão já cumpria o papel de fazer o cérebro parar de funcionar, pular para internet e continuar desligando involuntariamente o cérebro, não faz tanta diferença. (E esse foi um puxão de orelha bem direto a todos os que se perceberem nesse perfil.)
Vivemos sim, em uma sociedade pautada pelo consumo, onde caso as pessoas não têm o que fazer, se sentem entediadas e angustiadas. Incapazes de apreciarem o silêncio, ou a quietude de uma tarde tranquila, sentados em um banco de praça, sozinhos ou acompanhados. Não apreciam os prazeres simples. Dependem de seus smartphones, Ipads, ou qualquer outro aparelho para se distraírem. Tudo quanto o necessário e possível para evitarem terem de conviver com elas mesmas. Portanto, vivemos sim, em uma sociedade direcionada e dirigida pelo consumo do prazer como fonte de felicidade.
A maior parte das pessoas se sacrificariam para proteger os sistema que as aprisionam. |
Conformismo, medo de mudança e sensação de enorme impotência. Essas são as maiores violências morais praticadas pelo Estado, de maneira a coibir as pessoas a aceitarem o sistema. Pois é assim que as coisas são, e não será VOCÊ que conseguirá mudar as regras do jogo. Nós vivemos no CAPITALISMO, aceite esse fato (benzinho) e saia do seu sonho utópico de viver em um mundo melhor.
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Uma vez que você confronta a verdade, não há mais volta. |
Esses são alguns dos indícios de como essas duas incríveis distopias do século XX mostram sua influência sobre a nossa realidade do século XXI. Se isso não foi o suficiente necessário para te incentivarem a tomarem vergonha na cara e lerem os livros, de boa, eu não sei mais como ajudar!
As pessoas não encontram um sentido em sua vida ou em sua existência, e isso causa temor, depressão... Elas então, buscam qualquer coisa para esquecerem desse fato... buscam a todo instante "prazeres transitórios" e distrações, pois um minuto de contato direto consigo mesmo, é como um momento no inferno.
ResponderExcluirElas preferem um milhão de "11 de setembro", do que um momento de auto-reflexão. Imploram por tragédias... imploram por desastres.
Porque hoje vivemos na geração do "culto ao apocalipse zumbie"? Hum.... o apocalipse zumbie traria a mudança na vida dessas pessoas, mudança essa que precisa ser imposta a elas, pois não têm coragem de fazer as mudanças necessárias em sua vida, por si só.
Só acho que o final ficou com um teor muito julgativo.....
ResponderExcluirMelhor dizendo, está generalizado demais o uso da internet e dos livros, por exemplo....
E vc sabe exatamente o que estou dizendo.
ótimo texto, aliás, estou devorando tudo que há nesse blog, realmente me identifico muito com o que você escreve e a maneira que pensa
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