"É preciso a coragem de ser um caos para gerar uma estrela dançarina." - F. Nietzche.

terça-feira, 17 de junho de 2014

A Ontologia do Poder

Eu entorto a boca, o nariz e o olhar, toda vez que escuto alguém dizendo que a Anarquia é um sonho utópico e impossível. Atestam que em nenhum momento da história o homem conseguiu viver e conviver sem a presença do controle de alguma instituição como o governo, o estado, religião ou qualquer outra estrutura hierárquica. Eu gostaria de falar uma ou duas coisas sobre Utopia em resposta a estes.

Todos os inventos de engenharia provenientes dos estudos científicos, muito antes de serem concretizados, foram idealizados e sonhados por muitos homens. Imaginem um mundo onde bilhões de pessoas tivessem acesso livre, por uma fonte barata e segura, a quase todo o conhecimento produzido pelo homem? Imaginem uma ferramenta capaz de conectar pessoas de uma ponta a outra do globo e as possibilidades de integração e harmonização que surgiriam com isso? Imaginem sermos capazes de ir de uma ponta a outra do globo terrestre, em menos de um dia de viagem? Imaginem que tipo de mundo poderíamos construir, se todas as nações pudessem se intercomunicar em tempo real e tivessem a possibilidade de dialogarem diplomaticamente, rompendo as barreiras da linguagem para se entenderem melhor?

É óbvio que eu estou falando sobre uma série de tecnologias presentes em nosso tempo, como a internet e os meios de transporte mais avançados. Mas certamente, as aplicações que eu citei para elas, não são as mais observadas no nosso cotidiano presente, pois destaca-se: a falta de busca por informação mais qualificada, a divergência e o preconceito cada dia mais presente nas relações entre as nações do globo, a globalização da exploração em tempo real... Todos os recursos necessários para transformarmos a nossa experiência e vivência enquanto civilização humana está aí, disponível, esperando ser usada de forma apropriada e que viesse a beneficiar a todos. Mas que uso fazemos das mesmas?

E se fossemos imaginar um mundo com energia limpa e gratuita? Um homem já tentou fazê-lo antes e esteve muito próximo de concretizar seu projeto de prover energia gratuita para o mundo inteiro! Nikola Tesla tinha suas pesquisas financiadas por John Pierpont Morgan (JP Morgan), que por sua vez cortou o dinheiro quando descobriu os verdadeiros planos de Nikola Tesla: prover energia gratuita e limpa para o mundo inteiro! Esse sonho não era compatível com a industria da energia que lucra trilhões todos os anos mantendo as pessoas dependentes de diversos meios de captação de energia, ou pouco eficientes, ou extremamente nocivos ao meio-ambiente.

Tendo esses dois pontos esclarecidos, eu afirmo, muito pretensiosamente, que Utopia é ciência esperando ser concretizada e aplicada. A teoria Anarquista busca fundamentação nas ciências biológicas, políticas, naturais, sociais e em qualquer ou toda outra ciência que pode se imaginar! Embora eu não seja um cientista em qualquer área que seja, eu pretendo produzir algumas linhas sobre a minha Teoria a respeito do Poder, buscando uma forma de estudar sua natureza e seus efeitos observáveis nas relações sociais e hierárquicas.

Vontade é todo o potencial que um indivíduo tem de transformar a própria realidade, bem como, transformar a realidade que o cerca. Chamo de Poder, a transferência dessa Vontade de muitos indivíduos para outro indivíduo (ou grupo de indivíduos), que a concentra e acumula gradativamente.

Deste modo, todo o Poder emana daqueles que por ele são regidos. O Poder de uma autoridade é concedida a ela por transferência da Vontade daqueles que a ela concedem esse Poder. Em outros termos, se alguém se sente no direito de emitir ordens é exclusivamente por que quem escuta a essas ordens, aceita obedece-las.

O Poder não é uma grandeza estática nem auto-reflexiva. O Poder é algo que se manifesta, principalmente, nas relações de hierarquia e autoridade. Não se exerce Poder sozinho, muito menos, sobre si mesmo. A capacidade de se auto-governar não se caracteriza no exercício de Poder sobre si mesmo, mas em auto-disciplina.

Todo Poder acumulado obedece a uma lógica mecânica que visa o próprio sustento. Por caracterizar-se no acumulo da Vontade alheia, o Poder visa o próprio crescimento (mesmo que ela atinja níveis absurdos, como é o caso dos governadores fascistas e sanguinários da nossa história). O Poder trabalha exclusivamente para os seus propósitos - o acumulo de mais Poder. Caso alguma autoridade exercer o seu Poder para trazer "o bem ao seu povo", essa é apenas uma das manifestações que o Poder se permite com o intento de manter o próprio Poder.

Todo foco de Poder (concentração de Poder pela transferência da Vontade de uma população ou comunidade para um grupo reduzido de pessoas) se sente automaticamente ameaçado quando próximo a outro foco de Poder que diverge ao seu comando ou controle. Contudo, diferentes foco de Poder podem conviver em harmonia, desde que estejam respondendo ao controle e autoridade de outro foco de Poder que concentre e controle todos os outros, formando uma rede de Poder (caracterizada pela hierarquização dos diferentes exercícios de Poder).

1. Poder existe exclusivamente para o auto-sustento. (Poder pelo Poder)
2. Poder, por natureza e lógica mecânica, busca crescer indefinitivamente. (Poder concentra Poder)
3. Todo exercício de Poder visa - independente de seus efeitos - o auto-sustento ou o próprio crescimento. (Tudo pelo Poder)
4. O Poder se sente ameaçado por outros exercícios de Poder, exceto quando todos são controlados por outro foco de Poder. (Cadeia de Poder)

Parece arbitrário, tendencioso (e provavelmente o é, de fato). Não estou aplicando nenhum rigor necessariamente científico na minha análise, apenas tecendo a minha perspectiva dialética sobre o tema. Contudo, eu temo em afirmar que essa estruturação pode se revelar muito plausível, caso você busque verificar evidências dessa perspectiva em nossa sociedade.

Você pode observar a maneira como todo partido político que alcança o Poder, parece buscar fazer de tudo para agarrar e se manter no Poder, independente de estarem efetivamente exercitando sua autoridade de maneira a promover transformações profundas na sociedade. Percebemos as famosas "medidas eleitoreiras", onde os prefeitos entopem as cidades de obras nos anos de eleição, com a intenção de mostrar resultados aos seus eleitores. É duro e parece até clichê afirmar que a maioria dos governantes enxergam aos cidadãos apenas como eleitores. Mas analisando com mais cuidado, sempre fica difícil enxergar a situação de outra maneira.

Desta forma, dizer que a autoridade coercitiva do Estado funciona para mediar as relações entre os cidadãos, ainda deixa brecha para muitas dúvidas. Quem mediará as relações entre o Estado e o cidadão, quando o segundo se perceber coagido e injustiçado pelo mau exercício da autoridade do primeiro? Quem poderá salvar o povo do Poder que ele transferiu aos seus governantes, quando estes se revelarem verdadeiros fascistas que só têm olhos para o próprio umbigo?

No passado, o cenário político disputou influência com as autoridades religiosas. O cenário ainda não mudou muito. Mesmo quando se afirma que estamos vivendo em um "Estado Laico", nenhum governante do Estado deixa de dobrar-se de joelhos para a pressão exercida por várias das instituições religiosas mais influentes. Velhacas e extremamente experientes na arte da dominação e lavagem cerebral, muitas instituições religiosas dominam e subjugam mentalmente seus fiéis, tornando-os massa política fácil de ser manobrada aos seus interesses. O Poder do Estado e o Poder Religioso viveriam em conflito, caso não existisse o Poder Econômico para falar mais alto que os dois, mediando suas relações por interesse e benefício próprio.

Eu deixo para o leitor o exercício de tentar enxergar como essa Teoria poderia se encaixar nas diferentes relações de autoridade e Poder que podermos observar. Pense sobre a polícia (civil, federal, militar...) e como cada exercício de sua autoridade e Poder se intercomunica uma com a outra. Pense nas escolas e nas diferentes instituições de ensino e a forma como elas se intercomunicam, tanto entre si, quanto com o restante das instituições autoritárias. Pense sobre a autoridade exercida nas relações hierárquicas e prioritárias que se estabelecem na instituição da família tradicional, além do seu respaldo na manutenção da ideologia. As permutas são tantas que, para cada caso citado, poderíamos escrever um livro inteiro!

Voltando a dissertar e dissecar mais a natureza do Poder, eu percebo a necessidade de reforçar uma ideia. Todo Poder emana daqueles que ao Poder estão subjugados. Desta forma, o Poder não surge por meio do exercício de dominação. A lógica é exatamente oposta. O exercício de dominação só é possível por que está apoiado no Poder. Essa é a premissa para explicar como o verdeiro problema não se encontra na chamada "Cadeia de Poder", mas na "Cadeia de Obediência", pois ela dá sustento e berço para o surgimento e concentração de Poder.

Nossos governantes, individualmente, não são mais perigosos que um assaltante ou um batedor de carteiras. Contudo, sua voz de comando têm um Poder arrebatador, capaz de promover chacinas, tudo sob o aval do apoio popular. Em natureza, o Poder se caracteriza pela transferência, não apenas de Vontade, mas de responsabilidade para a mão daqueles que ocupam postos mais elevados em uma dada hierarquia. E AQUI MORA O PERIGO! Pois foi sob a alegação de estar "servindo a um bem maior" que foram cometidas as piores barbaridades da história. Foi sob a alegação de estar obedecendo a ordens, que humanos torturaram e mataram a outros humanos e continuam a fazê-lo até hoje!

A autoridade tem a incrível capacidade de corromper a moral humana. É simples perceber como muitas pessoas não se comportariam sozinhas, da mesma forma que se comportam quando estão recebendo ordens, ou quando se sentem amparadas pelo aval de alguma grande concentração de pessoas. Da mesma forma que muitos policiais não atirariam em manifestantes com balas de borracha, caso não recebessem ordens de seus comandantes, também existe o caso dos manifestantes que só se sentem encorajados a enfrentar e confrontar a polícia com pedras e paus, quando percebem o mesmo impeto manifestado em seus parceiros de luta. A autoridade intelectual também apresenta seu fascismo quando é exercida com a intenção de manipular a opinião pública, sob pretextos políticos velados. O Poder da oratória, só encontra endosso naqueles que a ela dão atenção e credibilidade.

Todo o Poder vem de baixo para cima, mas é exercido de cima para baixo.

A autoridade e o Poder andam de mãos dadas, mas lembrem-se, sempre, nenhuma delas tem origem naqueles que a exercitam, mas naqueles que por elas são dominados e controlados. Mesmo os povos que foram dominados à força por algum conquistador, antes de abaixarem cabeça para o novo mestre, lambiam os sapatos de outro rei. Assim como aqueles que dedicaram seu exercício de Poder a conquistar mais Poder, tiveram como ponto de partida, uma situação onde muitas pessoas passaram a transferir Poder e autoridade à sua voz de comando. Muitos foram os casos dos povos que não toleraram a submissão e por isso lutaram e travaram suas lutas libertárias. Mártires da liberdade não faltam na história (talvez faltem nos livros didáticos de história).

Enquanto as pessoas não estiverem aptas a assumirem maior responsabilidade por suas atitudes, a dissolução do Poder não poderá se efetivar. Não existe possibilidade de "governar para o bem", pois o exercício deste governo, quando tem respaldo nas relações de Poder, não pode ser bom. O Poder não visa o bem comunitário, ele visa, sempre, os próprios interesses de crescimento e dominação. Ele não permite a liberdade, pois, para que se possa viver livre, é necessário assumir absoluta responsabilidade pelas próprias ações. Tal liberdade é absolutamente incompatível com a autoridade, com a hierarquia e o com Poder.

Pronto, aqui está a sua Utopia! Enquanto uns chamam a teoria anarquista de Utópica, eu considero ilusória toda e qualquer tentativa de melhorar a condição humana que não vise a dissolução e aniquilação do Estado, da hierarquia, da autoridade e do Poder!

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